sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

UM CASTELO E VÁRIOS FEUDOS


Os congressistas, de um modo geral, reclamam do tratamento que recebem da imprensa e da população, ou seja, nada apreciativo. O Congresso Nacional tornou-se, com o passar dos anos, uma Instituição completamente subvertida, inócua, carcomida e de utilidade questionável. Nos últimos anos assistimos toda sorte de crimes praticados pelos “nobres” parlamentares em ambas as Casas sem lhes recair qualquer punição, o que é uma praxe. Não houve interesse sequer em elaborar-se um regimento interno que, pelo menos, coibisse a corriqueira e desprezível prática do ilícito. É bom que se diga que não se pode eximir a sociedade de ser co-autora de todos estes delitos a partir do momento que, por um motivo ou outro, delega poder aos inúmeros e notórios pífios que batem à sua porta pedindo seu voto, ou melhor, comprando-o ou simplesmente o surrupiando utilizando-se dos mais ignóbeis artifícios. Os parlamentares, bons e ruins, são eleitos democraticamente, portanto, é sim nossa responsabilidade em acompanharmos suas atuações exigindo lisura. Quanto aos nomeados devemos e podemos exercer pressão sistemática e contundente para que não assumam o cargo ou sejam dele exonerados, isso não quer dizer que tenhamos que lançar mão da força bruta necessariamente. A política não tem ser asquerosa, canalha, podre. Seu exercício, com um mínimo de dignidade, seria suficiente para resolvermos muitos problemas da nação. Porém, os homens que a exercem estão impregnados de egoísmo, cobiça, arrogância, prepotência, inveja e outros adjetivos tão ou mais nefastos. Podemos considerar este comportamento como um dos resultados de nossa formação cultural. Entretanto, não há nada que impeça de nos livrarmos das “heranças” malditas e isto só poderá começar a se concretizar através da educação e a longo prazo, mas educação com qualidade, isto é, sem a intervenção de leigos que trazem consigo interesses inconfessáveis, entre eles o de ganhos pecuniários fáceis, dividendos político-eleitoreiros e, o mais grave, empenho em ampliar e manter a ignorância. Podemos concluir então que nossos representantes são nosso reflexo, tanto para o bem como para o mau. Mas isso é mais complexo e, naturalmente, requer considerações mais minuciosas abrangentes. De qualquer maneira podemos dizer que os nossos representantes apenas nos refletem, tanto para o bem quanto para o mau.


Vamos ilustrar meu pensamento com exemplos irrefutáveis de homens que alçaram o poder através do voto direto, secreto e universal e que se comportaram de forma inadequada, mesquinha, truculenta, imoral, mercenária e por ai a fora. No Senado Federal Jader Barbalho (PMDB-PA), após denúncias de corrupção e enriquecimento ilícito renunciou à presidência da Casa em 2001 e, logo a seguir, ao mandato para fugir do processo de quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética (?) chegando a ser preso durante uma operação da Polícia Federal acusado de desvio de dinheiro público fato, aliás, que não o impediu de ser eleito em 2002 e 2006. Esteve também envolvido num escândalo na SUDAM (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia) de onde se escafedeu mais de US$ 1 bilhão. E mais fraudes no BANPARÁ (Banco do Estado do Pará). Na mesma ocasião o senador Antonio Carlos Magalhães, (DEM-BA) (1927-2007), que o havia precedido, também renunciou ao mandato acusado de violação no painel eletrônico de votações, fugindo também de uma possível cassação. Em 2002 foi reeleito. Então foi a vez de Edison Lobão (PMDB-MA), um dos integrantes dos “três porquinhos” (os outros dois eram Marcondes Gadelha e Hugo Napoleão) nos idos de 1989. Ocupa atualmente o ministério das Minas e Energias, mesmo detendo somente o conhecimento necessário em ligar e desligar um interruptor. Seu filho, conhecido por Edinho, assumiu sua vaga no Senado sob suspeita de estar envolvido em sonegação fiscal e uso de terceiros para esconder propriedade de empresas e procuração falsa. José Sarney (PMDB-AM), eleito este ano pela terceira vez para a presidência do Senado, é o político mais antigo em atividade no Congresso Nacional (desde 1955). Aliado importante em todos os governos que o sucedeu na presidência da República, talvez com exceção do ex-presidente Collor (1990-1992), que está mantido na Comissão de Relações Exteriores do Senado. Articulador hábil. Faz política à moda antiga. Renan Calheiros tentou explicar a origem do dinheiro com o qual pagava pensão para uma filha nascida de um relacionamento extraconjugal. Jurou de pés juntos que vendia gado de sua fazenda que sequer havia sido declarada no Imposto de Renda. Segundo consta, o ex-ministro da justiça havia se tornado o feliz proprietário invisível de emissoras de rádio e jornal nas Alagoas pagando por isso a bagatela de R$ 1,3 milhão. Foi absolvido duas vezes por conta de ameaças e intimidações e a indecente votação secreta. Em dezembro de 2007 renunciou à presidência da Casa, porém, conserva seu mandato.


A Câmara dos Deputados conta em seu acervo algumas figuras de péssima envergadura. João Paulo Cunha (PT-MG) foi apanhado no Mensalão ao sacar R$ 50.000,00. Extratos do Banco Rural confirmaram que sua esposa recebera R$ 200.000,00, valor que afirmou que iria justificar no momento oportuno que, aliás, ainda não chegou. O empresário Marcos Valério, operador do Mensalão e lavador de dinheiro entre outras patifarias, realizou sua campanha “publicitária” para a presidência da Casa e, posteriormente, para a Casa o que lhe valeu a acusação de dar tratamento privilegiado em procedimento licitatório. Também absolvido por ampla maioria. No STF (Supremo Tribunal Federal) encontra-se processo contra este cidadão por corrupção, formação de quadrilha, etc. Foi reeleito em 2006 como o deputado mais votado do Estado de São Paulo e o segundo no Brasil. Preside a Comissão de Reforma Política, a tal que cuida de diversas canalhices, inclusive do terceiro mandato. Então tivemos um azarão no páreo. Severino Cavalcanti que foi denunciado por cobrar propina de R$ 10.000,00 do empresário que explorava o restaurante da Câmara no que ficou conhecido como “Mensalinho”. Renunciou e hoje é prefeito da cidade de João Alfredo em Pernambuco. Pelo que me lembro a passagem de Aldo Rebelo (PC do B-SP) ficou marcada pela habitual vassalagem ao Palácio do Planalto. Arlindo Chinaglia (PT-SP) em abril de 2008 mandou desarquivar a PEC 23/99 que “dá nova redação ao parágrafo 5º do Artigo 14 e ao Artigo 82 da Constituição Federal” que trata da reeleição sem limites para presidente, governadores e prefeitos. Chegamos a Michel Temer eleito pela terceira vez. Peemedebista profissional e, portanto, a serviço da situação, seja ela qual for.


Com essas safras de dirigentes no Congresso Nacional espanta-me o fato de constituir-se uma supressa o castelo do deputado Edmar Moreira (DEM-MG) eleito Corregedor da Câmara. Não é a primeira vez que se nomeia a raposa para a guarda do galinheiro. Ele próprio indagou: “renunciar por quê?” e incentiva que o investiguem sabendo, de antemão, um resultado que lhe será favorável, de alguma forma. Em 1998 foi entregue a Polícia Federal e ao ministro da Previdência Social, Waldeck Ornérlas, um dossiê denunciando o enriquecimento ilícito do deputado onde constavam acusações de não recolhimento do FGTS. INSS (inquérito aberto no STF que soma mais de R$ 1 milhão, denunciado pela Procuradoria e, se aceita, se tornará réu em processo de apropriação indébita), ISS, Imposto de Renda em suas empresas na área de segurança. Aliás, com este item não brinca, nos últimos dois anos foi o deputado que mais gastou em segurança privada (R$ 236.000,00), da verba indenizatória. Em setembro de 2006 sua empresa de segurança, arruinada, obteve empréstimo no Banco do Brasil da ordem de R$ 1,9 milhão que prontamente os doou ao deputado. Em 2008 foi decretada sua falência e a Previdência Social cobra algo em torno de R$ 10 milhões. O empréstimo não foi pago e a empresa está sendo executada na 21ª Vara Cível de São Paulo e, nesta mesma cidade, estão 123 protestos que somam mais de R$ 500.000,00. Consta também que fora afastado da Polícia Militar por abuso de autoridade. Caso se procure certamente haverá mais coisas. Foi um cidadão deste calibre que foi aceito em partido político (sic) e que a Justiça Eleitoral, calcada numa legislação meio pau meio tijolo (para se dizer o mínimo), homologou, mais de uma vez, registro para disputar eleição. A imagem que fica é de que o parlamento brasileiro está, há muito, tomado por quadrilhas de malfeitores divididas em várias facções com o objetivo comum de espoliar, depredar e exaurir a nação. Este parlamentar tem um castelo e não tem um feudo, no entanto, existem inúmeros feudos sem castelos.


CELSO BOTELHO

07.02.2006