As coisas produzidas no Congresso Nacional podem ser sórdidas, mesquinhas, grotescas, safadas, imorais, etc. Portanto, não devemos, de modo algum, estranharmos quando lá encontrarmos o bizarro, o inusitado. Não achei graça alguma no pedido do senador Artur Virgilio (PSDB-AM) de convocar-se a Fundação Cacique Cobra Coral (FCCC) que, em seu site oficial, afirma que “sua missão é minimizar catástrofes que podem ocorrer em razão dos desequilíbrios provocados pelo homem na natureza”. Esta entidade tem relações estreitas com o poder público, notadamente com relação às intempéries, uma relação comercial o que implica dizer que recebe dinheiro do contribuinte para prevê-las e/ou evitá-las. Em matéria de apagão esta Fundação não é caloura, pois (segundo seu site) nos dão conta de que iria enviar um relatório ao ex-presidente FHC (1995-2002) sobre o blecaute ocorrido em março de 1999 mostrando que o raio caiu depois do apagão e, portanto, não foi sua causa. A justificativa do senador era mostrar a estratégia da base aliada em postergar o depoimento do ministro das Minas e Energia Edison Lambão e da Casa Civil Dilma Roussef, A Queridinha do presidente. Tal pedido foi, no mínimo, idiota. Mas esta não é a primeira vez que esta instituição é chamada a endereços públicos. Num lampejo de bom-senso a Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado cancelou o convite, cabe agora aguardar se convocarão os responsáveis (administrativos e técnicos) pelo sistema elétrico e quais as providências que serão adotadas, contudo, por precaução, aguardarei deitado posto que sentado canse por demais. Será que os profissionais do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) serão chamados? Duvido. Eles detectaram as causas de imediato e isso não é lá muito interessante para o governo petista.
Não é esporádico figuras públicas lançarem mão de especialistas em questões sobrenaturais para explicarem acontecimentos perfeitamente humanos ou, indo além, os prevendo e determinando como evitá-los ou minimizá-los. Como diria um amigo meu cada um vai para onde quer, até para o Partido dos Trabalhadores. Uns dizem que a médium que responde pela FCCC faz chover, outros que faz parar de chover, enfim tem controle sobre o tempo. Para que tal talento não seja desperdiçado posso sugerir que dê uma arrumada no planeta impedindo o degelo nas calotas polares, providenciando chuvas regulares nas regiões desérticas ou acomodando as placas tectônicas, há tantas coisas para serem ajeitadas e, é claro, prestar tais serviços gratuitamente, por caridade. A religião não está sendo questionada e sim os laços que seus membros mantêm com o poder público e a utilização do dinheiro público posso questionar quando, como e onde quiser e, o mais importante, seja lá de quem for. Digo isso porque sempre pode aparecer quem diga que sou preconceituoso, o que não é verdade.
O episódio reforça o que já sabemos: este Congresso Nacional que ai está não serve para nada, a não ser como veículo para a realização das safadezas sabidas e conhecidas de toda sociedade que, volto a dizer, caso não ocupe as ruas, as avenidas e outros espaços exigindo o que lhe é devido não há esperança alguma de começar a reverter este quadro. Só mesmo sendo muito ingênuo que se pode acreditar que o voto tenha esse poder, pelo menos no Brasil. O Senado Federal pode ser tudo: circo, trem fantasma, casa de tolerância, clube do Bolinha, cambalacheiro, relicário dos sete pecados capitais e por ai vai. A única coisa que não pode pretender ser é uma casa de representantes do povo. Há quem diga que ruim com ele, pior sem ele. Porém, diante de tanta sacanagem, seria uma estupenda economia privar-se desta Instituição. A Fundação Cacique Cobra Coral pode até explicar sobre o apagão, no entanto, absolutamente nada justifica a incompetência, inércia, descaso e omissão dos governos no setor elétrico.
CELSO BOTELHO
25.11.2009