Segundo o IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicada) a carga tributária brasileira é mais pesada para os pobres. Até ai morreu Neves. Não se pode dizer que tal constatação é inédita, surpreendente ou inusitada. Não estou qualificado para dissecar ou interpretar a pesquisa, estimativa, estudo ou o nome que se queira dar à divulgação do IPEA. No entanto, serve exemplarmente para que a sociedade, constituída em sua maioria por pobres, reflita e comece a fazer alguns questionamentos a cerca do binômio custo/benefício do Estado brasileiro.
Devemos observar atentamente a falácia governamental que pinta um quadro nacional paradisíaco quando a realidade é um grande borrão completamente disforme. O discurso do governo é demagógico, pífio, torpe. Segundo o Instituto o cidadão que recebeu até dois salários-mínimos no ano passado teve que trabalhar 197 dias em média (lá vem este cacete de média) para pagar tributos ao governo. Em contrapartida os felizes brasileiros que receberam uma remuneração mensal de trinta ou mais salários-mínimos precisaram de apenas 106 dias. É um país de todos como diz o slogan ufanista? Decerto que não. Então o Estado brasileiro não possui uma política tributária e sim uma sistemática apropriação indébita e, eis o mais revoltante, que visa claramente o menos favorecidos, justamente os que o governo alardeia uma “transferência de renda”. Os assalariados estão permanentemente acorrentados aos seus contracheques e, por isso, são alvos imóveis, fáceis. Não dispõem de nenhum mecanismo (legal ou ilegal) para se safar da rapinagem estatal enquanto outros segmentos deitam e rolam na sonegação. Mas estes o governo não está interessado em capturar, ao contrário, faculta-lhes todos os meios legais para prosseguirem com a velhacaria como, por exemplo, conceder-lhes alguns séculos (é isso mesmo: séculos, é só pesquisar) de parcelamento em seus débitos como ocorreu no governo do sociólogo FHC. Aliás, durante a era FHC e Lula a renúncia fiscal extrapolou todas as fronteiras do bom-senso, e isso é apenas um dos aspectos do entreguismo descarado que vem sendo praticado.
Não devemos nos concentrar no varejo oferecido pelos governos, mas sim no atacado. Isto é, precisamos e devemos criar uma consciência do coletivo como valor derradeiro a ser estabelecido e isto só poderá ser alcançado caso façamos um exame minucioso, sincero, objetivo e isento submetendo-nos a uma rigorosa avaliação de nossos valores individuais expurgando aqueles que se mostram nocivos a esta proposta e assim poderemos nos capacitar para decidirmos quais os rumos que desejamos para a nação. Os padrões morais estabelecidos e aceitos para a civilização certamente não há de requerer um profundo conhecimento filosófico para seu entendimento e execução. Refletir sobre o nosso comportamento cotidiano, as ações que praticamos ou deixamos de praticar é condição básica para prescrever o remédio a ser ministrado ao país, posto que os males dos quais sofre já foram diagnosticados há tempos. Não se enganem: nós, os contribuintes, somos o Estado e este apenas nos reflete. Isso quer dizer simplesmente que ele é a nossa imagem e semelhança. E por quê? Porque os homens encarregados da coisa pública são feitos de carne e osso como nós e não alienígenas invasores. Portanto, sua conduta deficitária encontra respaldo na sociedade que o elegeu. Então para se corrigir esta distorção será necessário nos corrigirmos. A responsabilidade pelas mazelas no Brasil são, sim, nossa. Seja quando vendemos nosso voto, seja quando nos omitimos, quando oferecemos propinas, quando compramos coisas pirateadas, quando furtamos sinais de televisão, energia elétrica, etc., quando ultrapassamos o limite de velocidade estabelecido em lei ou mesmo quando condicionamos a compra de um presente para nossos filhos à promoção de série na escola. Essas praticas por mais inocentes que nos pareçam vão moldando nosso caráter de maneira disforme, a inversão de valores é incorporada com sucesso durante toda nossa existência. Deste modo distorcemos nossa visão chegando mesmo a dizer que isto que ai está não tem jeito, que é assim mesmo, que ninguém irá resolver e que todos são pura e simplesmente ladrões. Quer dizer, conhecemos o fato, mas o entendemos como naturais num conformismo que beneficiam cada vez mais nossos algozes. Portanto, se as coisas chegaram neste patamar foi por nossa responsabilidade devido nossas ações e omissões. Mas não devemos esmorecer ou resignarmos-nos de forma alguma. Existe solução. Não está pronta, acabada, definida. Ela terá que surgir entre nós, mas para isto é fundamental que nos reexaminemos e descartemos todo o “lixo” ideológico que puseram em nossos quintais anos e anos a fio.
As migalhas distribuídas pelo governo sob o pomposo título de “transferência de renda” não passa de um jogo político-eleitoreiro safado, maléfico e não apresenta qualquer resultado minimamente próximo de razoável. Nós, brasileiros, precisamos urgentemente aprender de uma vez por todas que somos os contribuintes. Nós produzimos. O Estado deve limitar-se a arrecadar aquilo que for justo, pertinente e aplicá-lo com eficiência, zelo, honestidade, segundo suas atribuições legais sempre atendendo os interesses da sociedade que o irriga. Vamos refletir com bastante atenção sobre este dado divulgado pelo IPEA. O Estado, seja ele qual for, jamais poderá ser maior que o cidadão. Enquanto caminharmos docilmente rumo ao matadouro os açougueiros sempre estarão de plantão com seus facões afiados para descarnar-nos impiedosamente.
CELSO BOTELHO
02.07.2009