domingo, 1 de junho de 2008



ARQUIVO DO JACARÉ

A partir de hoje estarei publicando esta série de artigos escritos sobre vários assuntos em diferentes épocas. Para começar escolhi um que comenta o imbróglio que a Caderneta de Poupança Delfin foi durante os anos setenta e oitenta sob os auspícios do regime militar.

E A POUPANÇA DEU FIM.

Uma das coisas mais estúpidas que podemos fazer durante toda nossa existência é, sem dúvida, acreditar no governo, seja ele qual for. E, mesmo que andemos sempre com o pé atrás, sempre encontrará uma maneira de nos solapar. A benevolência estatal dos anos setenta e oitenta com o verdadeiro carnaval de concessões para o surgimento de inúmeras sociedades de crédito imobiliário e captação de recursos através das famigeradas cadernetas de poupança só poderiam ter dado em ressaca e muita dor de cabeça para os incautos poupadores, investidores e, como é de costume, contribuintes. Na edição de 08.03.1967 do Jornal do Brasil e de 02.03.1974 do jornal O Globo nos informavam que o Sr. Ronald Guimarães Levinsohn respondia a quarenta processos como falsificador e contrabandista e coisas dessa mesma natureza. Os crimes prescreveram e o acusado saiu incólume. Contudo, tornou-se o feliz proprietário da Caderneta de Poupança Delfin que, sejamos honestos, desenvolveu um marketing excelente e suas instalações azuis e impecáveis provocavam um bom impacto visual. Disputava o alegre mercado dos cofrinhos redondos de papelão com outras empresas similares tais como Aspa, Letra, Morada, todas sofrerão intervenção e foram liquidadas.

Durante a intervenção, na Delfin/SP, descobriu-se 220 mil pessoas ou instituições em contas fictícias no valor de Cr$ 1.738.386.000,00 (um bilhão, setecentos e trinta e oito milhões, trezentos e oitenta e seis mil cruzeiros). Foi publicado no jornal O Globo, edição de 03.02.1983, a versão de que tais contas eram uma tentativa de “melhorar a imagem” do setor de captação da empresa e, por este artifício, evitar a intervenção. Constatou-se que as contas em nome de jornalistas eram no exato valor de Cr$5.800.000,00 (cinco milhões e oitocentos mil cruzeiros), limite de garantia de retirada pelo titular no caso de intervenção. A abertura destas contas era, somente, parte de um esquema maior. Para esvaziar o patrimônio da sociedade imobiliária, cuja ação do Banco Central em intervir era eminente, para as empresas coligadas ou do mesmo serelepe proprietário ou que estivessem em nome de amigos e parentes. Em 16.12.1982 a Delfin/Rio e o BNH (Banco Nacional da Habitação) formalizaram um belo acordo, pelo menos para a caderneta, quitaram um débito com o banco no valor de Cr$ 60.800.000,00 (sessenta milhões e oitocentos mil cruzeiros) com terrenos que valiam, na mais otimista avaliação, Cr$ 6.400.000,00 (seis milhões e quatrocentos mil cruzeiros). Providenciaram também uma série de artifícios contábeis e simulação de negócios efetuados com as coligadas para burlar a tributação. Todos estes truques, com exceção das contas fictícias, por fim foram sancionados graças à generosidade do então presidente do Banco Central Sr. Afonso Celso Pastore que fixou em apenas dois dias, antes da intervenção, quando poderia tê-lo feito em sessenta dias, o Termo de Liquidação. Porque, neste período, as operações suspeitas poderiam ser anuladas por simples iniciativa dos liquidantes. Porém, para Levinsohn, ocorrera uma “confusão de laudos” e a culpa era do BNH, segundo ele próprio. Outra manobra detectada foi a quitação de um débito, acumulado desde 1974, pela Delfin/Rio de Cr$ 978.776.000,00(novecentos e setenta e oito milhões, setecentos e setenta e seis mil cruzeiros) em 1983 referente à prestação de serviço de divulgação em espaço e época indeterminada. Tal recurso esvaziava o patrimônio da caderneta em favor das empresas coligadas. Os processos foram arquivados. Em 2006 o STJ sentenciou que o acordo Delfin/BNH fora feito dentro da lei e a preço justo. Assim os réus passaram a ser a União e os liquidantes porque o Sr. Levinsohn pleiteia o ressarcimento dos prejuízos que sofrera com os maus administradores.

Este pacato e honesto cidadão atualmente é o dono da UniverCidade no Rio de Janeiro e a ela referiu-se assim: “ a faculdade é um hobby que me diverte muito “ Também, creio que por mero gozo, lida com a terra sendo um dos importantes plantadores de soja no oeste do Estado da Bahia. Possui imóveis no Brasil e nos Estados Unidos, também por pura farra. Reside numa mansão cercada pela Mata Atlântica na Gávea no Rio de Janeiro de 1.500 m2 com vidros canelados suspensos por gigantescas colunas de concreto. Dispõe na nababesca residência confortos básicos de um ex-banqueiro como piscina, quadra de squash refrigerada, vasta biblioteca, cinema com capacidade de 55 lugares, fornos de lenha para assar pizza (é sempre bom tê-los, nunca se sabe) e, naturalmente, para tão requintado canalha, não poderia faltas uma adega provida de safras formidáveis. Mas tudo isso é só por pura sacanagem ou, como diz, hobby.

Celso Botelho