sexta-feira, 6 de novembro de 2009

A RUÍNA DA REPÚBLICA


Segundo a sabedoria popular algo que começa errado invariavelmente acabará do mesmo jeito ou, até mais apropriadamente, pau que nasce torto morrerá torto. Com a República brasileira se dá a mesma coisa. Começou de um golpe militar substituindo o sistema e regime então vigentes, portanto começou torta. E assim, entre saltos e sobressaltos, ultrapassou um século de existência. Mas essa aparente longevidade não lhe permite sonhar com a eternidade e isso se deve a sua acelerada deteriorização. E, de mais a mais, cabe dizer que só os diamantes são eternos. A sucessão de ações degradatórias ao longo dos anos permitiu que se estabelecesse uma inversão de valores na sociedade com tal profundidade que acabaram por conceber as mais variadas justificativas para sua prática. O ilícito passou a ser encarado como direito consuetudinário. Nossa República foi engolida por uma macabra espiral descendente que redundará na sua ruína. A despeito de todos os problemas que nosso país tem sua causa e conseqüências podem se resumir em uma única palavra: moralidade, ou melhor, em sua flagrante ausência. Moralidade, ou um mínimo dela, sempre foi pura abstração para a classe dominante, porém atingimos níveis sórdidos. E consertar essa bodega não se constitui num desafio e sim num sonho de uma noite de verão (ou inverno, como queiram). Alguns amigos acham que sou um pessimista inveterado e a maioria deles concluem que vejo chifre de boi na cabeça de cavalo. No entanto não me zango ou ponho-lhes ralho, afinal, todos têm o direito de pensar o que quiserem, até bobagens. Mas a realidade, passada e presente, não me deixam alternativa senão a de vislumbrar um futuro desastroso.


Nossas Instituições foram construídas com sérias deformações estruturais e, com o correr dos anos, elas estão se agravando com vertiginosa rapidez, notadamente pelo auxílio “luxuoso” de eminentes crápulas de agora e de outrora. Nosso arcabouço legal pode não ser de todo ruim, porém é sistematicamente manipulado ao sabor dos interesses políticos e econômicos do momento de uma minoria em detrimento da maioria. Tomemos como exemplo o recente episódio no qual estiveram envolvidos o poder Legislativo e o Judiciário na cassação do mandato de senador Expedido Junior (PSDB-RO) acusado de comprar votos por R$ 100,00 (voto, mesmo com essa legislação safada, não se vende). Não discutirei os ritos processuais, mesmo porque desconheço os autos, tenho em mão apenas a noticia que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) o condenou, portanto de acusado passou a culpado. O STF foi chamado para opinar na pendenga e confirmou a cassação. E é ai que a porca torce o rabo: segundo a Constituição Federal o Judiciário pode cassar mandatos parlamentares e a decisão deve ser cumprida de imediato. No entanto, segundo esta mesma Constituição todo cidadão deve dispor do direito de defesa sem admitir que faltem ao réu as indispensáveis prerrogativas para justificar os seus atos. E ai? Interessante notar é que em alguns casos alardeiam o sacrossanto direito de ampla defesa e em outros o omitem. Querem um exemplo? Pois ai vai: ao ex-presidente Collor (1990-1992) tal direito foi negado ostensivamente e estamos falando da mesma Carta Magna. Conspiraram abertamente para apear do poder um presidente constitucionalmente eleito. Este exemplo é meramente ilustrativo, posto não deter e não desejar procuração nomeando-me seu advogado de defesa. Não menos constrangedor é o fato, segundo a grande imprensa, do senador empossado em seu lugar ter cerca de duzentos processos. Com essa gente o país vai se arruinando e reforçando o imaginário popular de que o crime compensa.


Podemos concluir que ao contrário do jogo de bicho a Constituição Federal (qualquer uma delas) não vale o que está escrito. Existe só para constar e atender os interesses daqueles que estão no poder. É uma Carta para inglês (e todo o mundo) ver e para o brasileiro ignorar. O único poder desta maltrapilha República que realmente exerce o mando (e o desmando) é o Executivo. Os outros dois (Legislativo e Judiciário) são meros acessórios, quando muito. A nossa Constituição é hibrida, ou seja, metade presidencialista e a outra metade parlamentarista, muito privatizante para o PT e muito estatizante para o PSDB e por ai a fora. É uma colcha de retalhos com estampas psicodélicas e, isso é uma constatação, considerando todas, na média já está na hora de rasgá-la e elaborar uma outra mesmo porque, como dizia David Nasser (1917-1980), não foi Moisés quem a escreveu. Não que defenda a convocação de uma Assembléia Constituinte porque redundaria em outra mediocridade onde os vícios seriam repetidos e até piorados dado as safras de politiqueiros que germinam nesta pátria mãe gentil. Estamos vivendo perigosamente com a perspectiva de um colapso institucional ocasionado pela gradual falência de nossas Instituições e a sociedade brasileira precisa manifestar-se de forma incisiva sob pena de enveredar num doloroso e irreversível processo de desintegração.


CELSO BOTELHO

06.11.2009