quinta-feira, 16 de junho de 2011

ÓI, ÓI O TREM


Não satisfeitos com a dinheirama que sairá dos cofres públicos por conta da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016 os salteadores (políticos, empresários, banqueiros e outras tralhas) estão alvoroçados com o projeto do trem-bala. No meu entendimento isto não é prioridade para um país como o nosso onde a sociedade reclama o atendimento minimamente digno de seus direitos (saúde, educação, segurança pública, saneamento básico, moradias, etc. e etc.) para os quais contribuem como uma carga tributária extorsiva. O trem-bala é inoportuno, desnecessário e servirá apenas para enriquecer inúmeros malfeitores que em sua construção estarão envolvidos. Em abril o Senado Federal aprovou por 44 votos a favor e dezessete contra a Medida Provisória nº 511/10 que autoriza o financiamento de até R$ 20 bilhões do BNDES, que também entrará com mais R$ 5 bilhões a fundo perdido. Antes de votarem no mérito os senadores apressaram-se para aprovarem o caráter de urgência e relevância da MP. Ora, aonde que este trem é urgente e relevante? Além do financiamento a MP autoriza a criação de uma nova estatal, a ETAV (Empresa de Transporte Ferroviário de Alta Velocidade) que será sócia dos investidores privados do projeto.

Em 2009 o presidente do Comitê Brasileiro de Túneis Tarcísio Celestino comparou os custos do projeto com base nos estudos elaborados pelo próprio governo federal. Vejamos. Os túneis nas áreas rurais custam 46% a mais do que nas áreas urbanas, quando devia ser o contrário. A escavação de um túnel simples com apenas uma via e 7,85 metros de diâmetro utilizando-se o método NATM (com explosivos que abrem buracos e o maciço recebe concreto projetado) é 17% mais caro que o equivalente no túnel duplo com 16 metros de diâmetro, quando o oposto deveria acontecer.

Nos 510 quilômetros do traçado do trem bala 90,9 quilômetros, equivalente a 18% da obra, devem ter túneis, segundo o estudo elaborado pelo consórcio Halcrow/Sinergia, contratado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para o projeto. As obras civis, que incluem também 107,8 quilômetros de pontes e viadutos, vão custar R$ 24,5 bilhões, ou seja, 71% de todo o projetado orçado em R$ 34,6 bilhões. Celestino aponta também que o preço do metro escavado de túnel em local onde o solo é composto por rocha é somente 4% mais barato do que o mesmo serviço em local onde o solo é mole, sem interferência de rochas. Tarcísio foi incisivo: "em casos reais de rocha de boa qualidade, a diferença pode superar 50%.O metro escavado de túnel numa área rural, sem grandes interferências na superfície, foi estimado no estudo do TAV em R$ 160,9 mil, enquanto em área urbana, com todas as interferências possíveis de uma cidade, o custo é de R$ 86,7 mil o metro. Estão previstos 18.778 metros de túneis duplos de 16 metros de diâmetro em área rural em todo o traçado, além de 46.571 metros de túneis simples de 7,85 metros de diâmetro em áreas urbanas. Já o custo orçado para escavar túnel simples de 7,85 metro de diâmetro pelo método NATM é de R$ 1.380 o metro cúbico, apenas 17% mais caro que o mesmo serviço num túnel duplo com 16 metros de diâmetro, estimado em R$ 1.180 o m³, segundo o estudo da ANTT.

Diante disso é chover no molhado repetir que no nosso país não se governa obedecendo a prioridades, mas sim ao interesse pessoal, político e corporativo. Ainda resta a questão da clientela que fará uso deste meio de transporte com os salários aviltantes que são pagos no Brasil. O trem de prata que fazia o trecho Rio-São Paulo foi desativado. O último Trem de Prata partiu na noite de 29 de novembro de 1998 da antiga estação Barra Funda (da EFSJ) chegando à estação Barão de Mauá (Leopoldina) na manhã de 30 de novembro. No início suas passagens custavam R$ 85 (cabine simples) e R$ 120 (cabine dupla), após algum tempo foram reajustadas para cabine simples, com cama de solteiro (R$ 120), cabine dupla, com beliches (R$ 240), e suíte, com cama de casal, banheiro amplo, frigobar, lavabo e armário (R$ 360). Portanto, a falta de experiência não poderá ser evocada caso o projeto, depois de concluído, ficar exposto as moscas. Todo essa grana que será drenada dos cofres públicos poderiam ser investidas em obras de infraestrutura, segurança pública, transportes de massa nas cidades (trens, barcos, metrô), saúde, educação (somente no Orçamento de 2011 Dilma DuCheff retirou da educação R$ 1 bilhão), promover eficiência nas rodovias, nos aeroportos e portos etc. O trem-bala não é mais importante do que os setores aqui mencionados, pelo contrário dele podemos prescindir muito satisfeitos.

CELSO BOTELHO
16.06.2011